Gn 3,9-15; Sl 130 [129] ; 2Cor 4,13-5,1; Mc 3,20-35
1. Meus irmãos,
Nosso Senhor Jesus Cristo, o Messias, nosso Salvador, iniciou sua missão convocando as pessoas à conversão “convertei-vos e credes no evangelho” (Mc 1,15) O que é conversão? Conversão é deixar os pecados para se viver segundo a vontade de Deus. Para tanto, para a nossa conversão, Jesus nos oferece o perdão, Jesus nos oferece a salvação, e nos faz experimentar a Sua misericórdia, a divina misericórdia.
2. O evangelho da missa de hoje nos mostra um momento dramático da missão de Jesus. Ele foi acusado por seus familiares de estar fora de si (v. 21) e, pelos mestres da Lei, de expulsar demônios pelo poder de Belzebu (v. 22). Para os contemporâneos a Jesus, Belzebu era um dos principais demônios. O demônio era considerado como um anjo decaído, antes da criação do mundo. No livro da Sabedoria, o demônio é identificado com a serpente que tentou o primeiro casal (cf. Sb 2,24), e o fez pecar por orgulho (cf. Gn 3). Por isso, ouvimos na 1ª. leitura as consequência do primeiro pecado, chamado “pecado original”. Nesta leitura, Deus, diante do primeiro pecado, dá a esperança do perdão: “porei inimizade entre ti e a mulher, entre tua descendência e a dela. Esta te ferirá a cabeça e tu lhe ferirás o calcanhar” (v. 15). Assim, com a graça de Deus, a humanidade haverá de esmagar a cabeça da serpente. Mais tarde, este versículo foi entendido à luz da esperança messiânica, ou seja, que o Messias venceria o demônio, e é Jesus Quem cumpre esta profecia, como ouvimos no Evangelho.
3. Jesus é acusado de ser o chefe dos demônios, e por isso podia expulsar demônios. Os que, assim o acusaram, de um lado, não enxergaram o bem que Jesus faz, e do outro, fazem a vil acusação de que ele, o Filho de Deus, é o chefe dos demônios. Jesus, então usando a lógica elementar, diz que se fosse um demônio a expulsar demônios, o reino dos demônios estaria dividido. Mas o pior não está na falta de lógica, mas na malicia de não ver em Jesus Cristo a ação de Deus, e, sobretudo, na vil acusação de dizer que Ele é um demônio.
4. Diante desta acusação, Jesus disse: “Tudo será perdoado aos homens, tanto os pecados, como qualquer blasfêmia que tiverem dito. Mas quem blasfemar contra o Espírito Santo, nuca será perdoado, mas será culpado de um pecado eterno” (vv. 28-29). É uma frase grave nos lábios de Jesus, em Quem a humanidade experimenta a misericórdia de Deus. Ele é a misericórdia de Deus em pessoa, como nos diz o Papa Bento XVI. Deus nos oferece a Sua misericórdia através de Jesus. É necessário acolher o perdão e a misericórdia, jamais resistir. Aqui está a advertência de Jesus, ou seja, se resistimos ao amor de Deus, se resistimos à Sua misericórdia. Disse Jesus que é possível blasfemar, até, blasfemar, mas jamais blasfemar contra o Espírito Santo. Blasfemar é grave, mas Jesus não nega o perdão. Mas blasfemar contra o Espírito Santo é recusar deliberadamente a acolher a misericórdia de Deus, é rejeitar o perdão oferecida pelo Espírito Santo de Deus (cf. Catecismo da Igreja Católica, n. 1864). O fiel que, assim, resiste ao amor de Deus se auto-exclui da salvação e, por isso, Jesus alerta que não terá perdão, especialmente neste contexto em que Ele é acusado de ser o príncipe dos demônios. Estas frases fortes de Jesus são para nós um alerta, para que confiemos n’Ele, para que confiemos no Seu amor, na Sua misericórdia, para que a Sua força se manifeste em nós.
5. Nesta mesma ocasião vão ter com Jesus a Sua mãe e Seus parentes, os Seus irmãos (v. 32). Jesus diz aos presentes: “Aqui estão minha mãe e meus irmãos. Quem faz a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (vv. 34-35). É uma frase chocante. Parece uma reprovação à Sua família e, nela, à Nossa Senhora. Jesus, em primeiro lugar, quer dizer que o Reino de Deus, que Ele inaugurou, não se edifica baseado em vínculos familiares, mas a partir de quem faz a vontade de Deus. É como recitamos no “Pai Nosso”: “Venha a nós o vosso Reino; e seja feita a vossa vontade, assim na terra como nos Céus”. De fato, Jesus não quer reprovar a Sua família, mas manifestar que o Seu Reino é construído por quem faz a vontade de Deus. E, longe de reprovar Nossa Senhora, esta forte frase de Jesus está em sintonia com a frase que Ela disse quando aceitou a missão de ser a Mãe de Deus: “Eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a vossa palavra”. Maria, a Nossa Senhora, é, assim, modelo da família de Cristo, modelo de quem faz a vontade de Deus.
6. Diante de Cristo, somos chamados a confiar n’Ele, a permitir que a Sua força se faça presente em nossas vidas. É como ouvimos na 2ª. leitura: “... certos de que (Deus) ressuscitou o Senhor Jesus, nos ressuscitará também com Jesus e nos colocará a seu lado” (v. 14). A fé em Cristo e na força do Seu Espírito nos permite ser sempre perseverantes, apesar das provações (vv. 16-17) e, sobretudo, ter discernimento em todos os momentos da vida. No dizer de S. Paulo, que “voltemos os nossos olhos para as coisas invisíveis e não para as coisas visíveis. Pois o que é visível é passageiro, mas o que é invisível é eterno” (v. 18). Não se trata de viver alienados, iludidos pelas “coisas celestes”. Fixar-se em Deus nos permite saber escolher o que é mais importante dentre todas as coisas, as coisas que não passam em meio as coisas que passam. Fixarem-se em Deus nos proporciona, também, acolher a vontade de Deus e a colocá-la em prática, pois só a vontade de Deus nos faz felizes, na vida presente, e nos conduz a vida eterna.
7. Meus irmãos, as três leituras que hoje ouvimos são exigentes, mas Deus não nos nega o Seu perdão, Deus não nos nega o Seu favor. Diante do primeiro pecado, Deus afirma que a humanidade se sairá vencedora (1ª. leitura). A nossa vitória está em Jesus Cristo, nosso Salvador, que tendo ressuscitado dos mortos nos proporciona a nossa ressurreição com Ele (2ª. leitura). E, apesar de nossos pecados, Deus nos oferece o perdão, Deus nos permite experimentar a Sua misericórdia. Contudo, Deus não nos tia a nossa liberdade e, por isso, é possível resistir ao amor de Deus, que é o pecado contra o Espírito Santo. Jesus nos alerta, sim, que é o pecado mais grave, para o qual não há perdão, porque assim o fiel resiste. Jesus nos alerta, para que jamais resistamos ao Seu amor, mas para que o acolhamos, e coloquemos em pratica a Sua Palavra. Jesus disse: “Quem faz a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe”. E, a exemplo de Nossa Senhora, estamos aqui para Lhe dizer: “Eis aqui os servos do Senhor, faça-se em nós segundo a vossa palavra”!
V. Louvado seja N. S. Jesus Cristo!