XVII DTC – B (30-07)
(2Rs 4, 42-44; Sl 145; Ef 4, 1-6; Jo 6, 1-15)
1. Meus irmãos, o Evangelho que acabamos de ouvir é um trecho do capítulo sexto do Evangelho segundo S. João. Por cinco semanas seguidas leremos, na missa dominical, um passo deste sexto capítulo, no qual Jesus se apresenta como o Pão da Vida (v. 35) e, assim, prepara o Seu Povo para celebrar a Eucaristia, a missa, que nos alimenta na vida presente, e é penhor para a vida eterna.
2. No trecho que há pouco ouvimos, Jesus multiplica o pão para uma multidão faminta, calculada em cinco mil pessoas (v. 10), que não só ficou satisfeita, como também deixou sobras (v. 12), de forma similar ao que fez o profeta Eliseu, como ouvimos na 1.a leitura.
3. O relato desta multiplicação dos pães é bastante caracterizado. Notamos, em primeiro lugar, que este milagre é feito em meio a outros, à multidão que acorria a Jesus, no mar da Galiléia (vv. 1-2). Em segundo lugar, Jesus subiu a montanha com seus discípulos (v. 3), próximo da Páscoa “a festa dos judeus” (v. 4). Há, portanto, um contexto pascal neste milagre. Jesus sobe o monte, o local que recorda a primeira Aliança (Ex 20) e que prefigura o Monte Calvário, onde Jesus dará a sua vida pela humanidade na cruz, a Páscoa de Jesus, que será a Páscoa dos Cristãos.
4. A morte e ressurreição de Jesus se darão por ocasião da festa judaica da Páscoa e, ambas, morte e ressurreição, passaram a constituir a Páscoa dos cristãos. E, da morte e ressurreição a Eucaristia será o memorial, instituído por Jesus na Última Ceia.
5. Jesus é o Bom Pastor, como meditamos semana passada, que dá a Sua vida pelas ovelhas (Jo 10, 14-15) e, assim, deu a maior prova do amor de Deus por nós, e também a maior prova de Sua compaixão conosco. Esta compaixão também é percebida no Evangelho de hoje, quando Jesus vê a multidão e se preocupa com a sua alimentação.
6. Deve-se notar que Jesus multiplicou os pães a partir da doação que um menino fez de cinco pães e dois peixes. Este gesto é muito rico. Um menino fez a doação dos pães, talvez porque se fosse um adulto não o faria. Mas é de se notar que um menino antes dos 13 anos não era alguém considerado na sociedade judaica de então. Para Deus não há criatura de segunda categoria, e Ele escolhe o que é fraco para mostrar a sua força, o seu poder (cf. 1Cor 1, 27; 4, 10).
7. Este menino deu seus cinco pães e dois peixes. Esta doação contém o número sete, que é o número da perfeição. Desta forma, embrionariamente, a doação deste menino possui a plenitude, que se realiza em Jesus Cristo. Há de se notar também que a palavra peixe em grego (ICTUS) constituía a série de iniciais das palavras que expressam a fé dos primeiros cristãos: Jesus Cristo Filho de Deus Salvador. O símbolo do peixe era freqüentemente usado pelos cristãos em meio às perseguições. Alguns desenhavam um peixe com uma cesta com pães para representar a Eucaristia. Com certeza, o Evangelho que hoje ouvimos era de capital importância para os primeiros cristãos, tão provados pela perseguição, mas confortados pelo próprio Cristo, o Pão da Vida, o Pão da vida eterna.
8. O evangelista S. João não nos apresenta no corpo de seu Evangelho a Instituição da Eucaristia no relato da Última Ceia, mas várias passagens de seu Evangelho apontam para a Eucaristia, testemunhando, assim, a presença da Eucaristia nas comunidades de Éfeso, onde S. João exerceu o seu apostolado. Uma das passagens do Evangelho de S. João que aponta para a Eucaristia é este relato da multiplicação dos pães. Nele não só temos a multiplicação dos pães par nos lembrar a Eucaristia, mas também o gesto com o qual Jesus procede a este milagre: tal qual na Última Ceia, Jesus tomou os pães, agradeceu a Deus e distribuiu aos que estavam sentados (v. 11; cf. Lc 22, 19; par.). Outra referência à Eucaristia, mesmo que indireta, é a quantidade de cestos com os quais se recolheram as sobras dos pães, doze, o número das doze tribos do Povo de Israel, número dos Apóstolos com os quais Jesus fundou a Igreja, o Novo Povo de Deus, o Novo Israel. Assim, a multiplicação dos pães e o seu relato nos preparam para compreender que Jesus é o Pão da vida (Jo 6, 35), que se dá como alimento a Seu Povo, penhor da vida eterna.
9. Após saciar os famintos, Jesus dá a seguinte ordem: “Recolham os pedaços que sobraram, para não se desperdiçar nada” (v. 12). De fato, o Reino de Deus é Reino de fartura, e não do desperdício. Por isso, na oração do “Pai-Nosso”, a oração modelar dos cristãos, Jesus nos ensina a rezar “O pão nosso de cada dia, nos daí hoje” (Mt 6, 11). Nesta oração que o Senhor nos ensinou chamamos a Deus de “Pai Nosso”, e não “Pai Meu”, Lhe pedimos o “pão nosso”, e não o “pão meu”, e lhes pedimos o pão de cada dia, para que evitemos o acúmulo, e, assim, que não falte o pão de cada dia a ninguém. Assim, compreendemos que o Reino de Deus é reino de fartura, não do desperdício.
10. Por fim, temos a reação do povo, que não foi a reação esperada por Jesus. Jesus é o Messias, o enviado do Pai dos Céus, do Pai Nosso, para a nossa salvação. Jesus exerce a seu messianismo na sua solidariedade para com os pobres, para, a partir deles, manifestar o amor de Deus por toda a humanidade. Os pobres foram saciados, mas não compreenderam a lição de solidariedade dada por Jesus e, por isso, queriam fazê-Lo rei (v. 15).
11. Diante deste fracasso, Jesus se retira sozinho para a montanha (v. 15), onde Ele freqüentemente se recolhia para rezar. Daqui para diante, Jesus manterá o seu apostolado com as multidões, mas dará uma atenção especial aos Doze Apóstolos, que serão os prolongadores de sua missão, depois que ela for concluída, com sua morte e ressurreição. Esta atenção especial dada aos Apóstolos pode ser percebida quando, depois de ter pregado à multidão, Jesus toma os Doze Apóstolos à parte, e explica a sua pregação (cf. Mc 4, 34).
12. De fato, os Doze Apóstolos seriam os prolongadores da missão de Jesus, e juntos constituem o que depois foi chamado Colégio Apostólico. O Colégio Apostólico ou Colégio dos Apóstolos, com a morte dos Apóstolos, foi sucedido pelo Colégio dos Bispos, que são, na Igreja, os sucessores dos Apóstolos. Mas, aqui nos interessa recordar que foi com os Doze que Jesus fez a Sua Última Ceia, ocasião em que Ele instituiu a Eucaristia e o Sacerdócio do Novo Testamento. Jesus, na Última Ceia instituiu a Eucaristia, a ser celebrada na memória de sua paixão, morte e ressurreição, e instituiu os Doze sacerdotes da Nova Aliança, para presidirem a Eucaristia, sobretudo com o mandato: “Fazei isto em memória de mim” (Lc 22, 19; par.).
13. Jesus é o Sacerdote da Nova Aliança. A Jesus, a Carta dos Hebreus aplica a Jesus o Salmo 110: “Tu és sacerdote eternamente, segundo a ordem de Melquisedec” (Sl 110, 4; Hb 5, 6; 7, 17; cf. Hb 5, 10). Jesus é o sacerdote eterno porque fez a oblação de sua vida (Jo 10, 15. 17-18), e a fez de forma definitiva para a salvação da humanidade (cf. Hb 9, 12; 9, 15; 9, 28; 10, 10; 12, 27-28; cf. 2, 14-18). A Eucaristia celebrada pelo Novo Povo de Deus, presidida pelos bispos, sucessores dos Apóstolos, e pelos padres, seus colaboradores, não repetem o sacrifício de Jesus, que foi único (Hb 9, 12), mas o atualizam, ou seja, o tornam presente a alimentar a Igreja, o Novo Povo de Deus na sua caminhada na história. A Eucaristia é também antecipação do Banquete Celeste, quando por Deus seremos servidos (cf. Lc 12, 37), e o veremos face a face (1Cor 13, 12).
14. Meus irmãos, durante as próximas quatro semanas meditaremos sobre este capítulo sexto do Evangelho segundo S. João, e assim teremos oportunidade de aprofundar a nossa fé em Jesus Cristo, Pão vivo descido dos Céus (Jo 6, 35-41), e sobre a Eucaristia, memorial da páscoa de Jesus, de sua morte e ressurreição, que atualiza o seu sacrifício por nós, nos alimenta na vida presente para sermos fiéis a Deus, e nos antecipa o Reino dos Céus.
Louvado seja N. S. J. C. !