Solenidade de Pentecostes (2012)



Solenidade de Pentecostes (2012)
At 2,1-11; Sl 104[103]; 1Cor 12,3b-7.12-13; Jo 15,26-27; 16,12-15

1. Meus irmãos,
Com a Solenidade de Pentecostes concluímos o Tempo Pascal. Foram 50 dias com os quais tivemos oportunidade de aprofundar o mistério da Páscoa de Jesus Cristo, da qual nos vem a nossa salvação.
2. Páscoa e Pentecostes eram festas do Povo de Israel, o Povo do Antigo Testamento. A Páscoa era a celebração da libertação da escravidão no Egito, e o Pentecostes, a celebração dom da Lei de Deus, quando Deus, através de Moises, entregou os Dez Mandamentos, cinquenta dias após a passagem do Mar dos Juncos (cf. Ex 19-20).
3. A Igreja, o Novo Israel, o Israel de Deus, tem na Páscoa de Jesus Cristo – Sua morte e ressurreição – a sua Páscoa, e na vinda do Espírito Santo, o seu Pentecostes. De fato, no primeiro Pentecostes se celebrava o dom da Lei de Deus fixada nas tábuas de pedra. Era a “Festa da Aliança” de Deus com o Seu Povo. No Pentecostes do Novo Povo de Deus, com a vinda do Espírito Santo, temos a “Festa da Nova Aliança”, não mais fixada na pedra, mas fixada nos nossos corações (cf. Jr 31,31-33; Ez 36,26-27). Assim, as Festas da Páscoa e de Pentecostes ganharam para nós, cristãos, novos significados a partir do evento Jesus Cristo e da vinda do Espírito Santo à Igreja nascente. E há uma profunda relação entre as Festas de Páscoa e de Pentecostes como há uma profunda relação entre as missões do Filho e do Espírito Santo em prol da nossa salvação.
4. Quem é o Espírito Santo? O Espírito Santo é o amor do Pai e do Filho. Nós a Ele nos referimos como a Terceira Pessoa da SSma. Trindade, e a Ele atribuímos a santificação da humanidade. Mas a ação do Espírito Santo não se inicia no dia de Pentecostes. O Espírito Santo é eterno como o Pai e o Filho, e agiu na criação do universo (cf. Gn 1,2; 2,7; Ecl 3,20-21; Ez 37,10), e constantemente a renova. Por isso, recitamos o Salmo 104[103] e o seu notável refrão: “Envia teu Espírito Senhor, e renova a face da terra” (v. 30). O Espírito Santo esteve presente na encarnação do Filho de Deus, como disse o anjo Gabriel a Virgem Maria: “O Espírito Santo virá sobre ti, e o poder do Altíssimo te cobrirá com a tua sombra” (Lc 1,35). O Espírito Santo acompanhou o Filho de Deus enquanto esteve na terra, inclusive nos momentos derradeiros de Sua morte (cf. Jo 19,30) e de Sua ressurreição (cf. Rm 1,3-4). O Espírito Santo, que falou pelos profetas (DZ 150), fala na Igreja, para que ela sempre dê testemunho de Cristo. E na Igreja, o Espírito Santo Se dá a conhecer na Bíblia, que Ele inspirou, na transmissão da fé, chamada Tradição, assistindo o Magistério dos Bispos, na Liturgia, na oração, nos dons e ministérios, em toda ação da Igreja, e no testemunho dos Santos (cf. Catecismo da Igreja Católica, n. 688).
5. A 1ª. leitura nos descreve a vinda do Espírito Santo à Igreja nascente. S. Lucas, o Autor dos Atos dos Apóstolos, assinala que a vinda do Espírito Santo, prometido por Jesus, se deu no dia de Pentecostes (v. 1), ou seja, no dia da “Festa da Aliança” do Povo de Israel. Daqui para diante, o Pentecostes terá outro significado para os cristãos: não será mais a Lei fixada na pedra, mas a “Festa da Nova Aliança”, fixada nos nossos corações, por obra do Espírito Santo de Deus.
6. S. Lucas disse que “os discípulos estavam todos reunidos no mesmo lugar” (v. 1). Esta formulação recorda quando o Povo de Israel acolheu a Aliança no Monte Sinai (cf. Ex 19,8). Agora o Novo Povo de Deus, não mais no Sinai, mas em Jerusalém, acolhe a Nova Aliança no dom do Espírito Santo. Depois de uma série de fenômenos, típicos das manifestações de Deus no Antigo Testamento – barulho, vento, línguas de fogo – S. Lucas disse que o Espírito Santo desceu sobre os presentes e lhes inspirou falar em outras línguas (v. 4). Em seguida, S. Lucas manifesta o caráter universal do dom do Espírito Santo, ao dizer que em Jerusalém moravam judeus piedosos de todas as nações do mundo (v. 5) e fez um elenco delas (vv. 9-11). Isto porque a salvação em Jesus Cristo é oferecida a todas as nações (cf. At 1,8), e dom do Espírito Santo há de garantir esta universalidade, manifestada neste dia de Pentecostes.
7. Nesta ocasião, os discípulos começaram a falar em outras línguas (v. 4), e os presentes ouviam na própria língua (vv. 6-8.11). Mais uma vez se manifesta o caráter universal da missão de Jesus, não apenas na presença de membros de todas as nações conhecidas de então, mas estas compreendem a Palavra de Deus na própria língua. Desta forma, está desfeita a confusão das línguas que resultou da Torre de Babel (cf. Gn 11,1-9). Com o dom do Espírito Santo, que atualiza a mensagem de Jesus, a diversidade de línguas permanece, mas é possível acolher a Palavra de Deus na própria língua, e render o mesmo louvor a Deus a uma só voz.
8. Semana passada, na ‘Solenidade da Ascensão do Senhor’, ouvimos na 2ª. leitura S. Paulo dizer que Jesus é a Cabeça da Igreja, e que ela, a Igreja é Seu corpo (cf. Ef 1,22-23a). Na liturgia de hoje, também na 2ª. leitura, temos um trecho de outra carta de S. Paulo no qual o Apóstolo fala que a Igreja é o Corpo de Cristo: “Como o corpo é um, embora tenha muitos membros, e como todos os membros do corpo, embora sejam muitos, formam um só corpo, assim também acontece com Cristo” (v. 12), e prossegue: “... fomos batizados num único Espírito, para formarmos um único corpo, e todos nós bebemos de um único Espírito” (v. 13). Semana passada, meditávamos que na Ascensão do Senhor a nossa humanidade foi assimilada definitivamente com Deus, porque somos membros do Corpo de Cristo, que é a Igreja. Hoje recordamos que foi através do Batismo que fomos inseridos no Corpo de Cristo, e que o Espírito Santo é a ‘seiva’ deste Corpo, que nos dá o dom da fé, que nos permite confessar que Jesus Cristo é o Senhor (v. 3b), e que o bem que cada um faz, deve fazê-lo para o bem dos irmãos (v. 7).
9. De fato, disse S. Paulo: “a cada um é dada a manifestação do Espírito em vista do bem comum” (v. 7). Semana passada, na Solenidade da Ascensão, ouvimos Jesus dizer que os Apóstolos seriam revestidos da força do Espírito Santo para serem as Suas testemunhas até os confins da terra. Neste versículo de S. Paulo compreendemos que seremos as testemunhas de Cristo se colocamos os dons que o Espírito Santo nos dá a serviço dos irmãos. O Espírito Santo é o primeiro dom de Deus. Pai e Filho enviam o Espírito Santo para que tenhamos fé, para que as palavras de Cristo se tornem vida na nossa existência, e para os dons que Ele nos dá sejam postos a serviço dos irmãos. Assim, percorremos o caminho de paz traçado por Jesus na nossa história, assim seremos as Suas testemunhas na construção de Seu Reino de Paz.
10. O Evangelho da missa de hoje é constituído de dois pequenos trechos do relato da Última Ceia segundo S. João. Ouvimos Jesus dizer: “Quando vier o Defensor que vos mandarei da parte do pai, o Espírito da verdade que procede do Pai, ele vos dará testemunho de mim” (v. 26). Temos neste versículo uma confissão indireta da Trindade de Deus – Pai e Filho e Espírito Santo. Jesus promete o Espírito Santo aos Seus discípulos, e o apresenta como o “Defensor” (Advogado, Auxiliador, Mediador, Consolador). Noutra passagem, Jesus Se refere ao Espírito Santo como o “outro Defensor” (cf. Jo 14,16). Jesus, assim, Se expressou por Ele é o “Defensor” da humanidade, o nosso Salvador. Jesus, o Filho de Deus, foi enviado pelo Pai para a nossa salvação, e Ele sempre teve a assistência do Espírito Santo para realizar a Sua missão em meio a nós. Como as missões do Filho e do Espírito Santo estão intimamente unidas, Eles são os nossos “Defensores”, a nos proporcionar a nossa salvação, a nos defenderem de nossos pecados.
11. Jesus, na Última Ceia, falou mais uma vez do Espírito Santo. A Última Ceia tem um caráter de revisão da missão realizada por Jesus, e tem, também, um caráter de despedida. Na verdade, Jesus não Se despede e não nos abandonará. É na mesma ocasião que Ele disse: “Eu vou e volto para vós” (Jo 14,28). De fato, Jesus realizou a nossa salvação, e ascendeu aos Céus, como celebramos semana passada. A Ascensão não é despedida de Jesus, como meditamos semana passada, mas a Sua glorificação definitiva, de forma que Ele está presente em todo o Universo. Como isto é possível? Como é possível dizer “Jesus Cristo é o Senhor!” (2ª. leitura)? Como é possível dizer em toda missa “Ele está presente no meio de nós!”? A presença de Jesus, na Igreja e no mundo, é possível graças à ação do Espírito Santo, o “outro Defensor”. Jesus Cristo, o Filho eterno do Pai, veio nos “defender” do pecado e nos proporcionar a nossa salvação. O Espírito Santo, o “outro Defensor”, foi enviado pelo Pai e pelo Filho, para atualizar a vida e a missão de Jesus em meio aos fiéis. Por isso, S. Paulo disse: “Ninguém pode dizer: Jesus é o Senhor, a não ser no Espírito Santo” (v. 3b). Portanto, meus irmãos, o Pai dos Céus envia o Filho e o Espírito Santo, cada Qual a Seu modo, a fim de salvar a humanidade do pecado e, assim, nos proporcionar a nossa salvação. No dizer de S. Irineu (séc. II), Filho e Espírito Santo constituem “as duas mãos do Pai” (Adversus haereses, IV, 7, 4: PG 7, 992-993; V, 1, 3: PG 7, 1123; V, 6, 1: PG 7, 1137; V, 28, 4: PG 7, 1200).
12. Jesus disse que o Espírito Santo “dará testemunho de mim” (v. 26). Semana passada, na Solenidade da Ascensão, ouvimos Jesus prometer o Espírito Santo e dizer que Seus discípulos seriam as Suas testemunhas. Aqui percebemos como as duas orientações dadas por Jesus se unem na missão do Espírito Santo. Isto porque, o prometido Espírito Santo daria testemunho de Jesus, para que os Seus discípulos também deem testemunho – por palavras e obras – em todo tempo e lugar, até os confins da terra. Conforme Jesus promete o Espírito Santo, Ele manifesta um movimento trinitário, ou seja, Ele manifesta como as Três Pessoas divinas – Pai e Filho e Espírito Santo – estão implicadas na nossa salvação: Disse Jesus: “Tudo o que o Pai tem é meu” (v. 15a). O Pai dos Céus, em Quem todos somos irmãos, envia o Filho, e envia o Espírito Santo, para a nossa salvação. Por isso Jesus pode dizer: “Tudo o que o Pai tem é meu”. E prossegue: “Por isso, (o Espírito Santo) ... receberá do que é meu para vos anunciar” (v. 15b), “e vos guiará em toda verdade” (v. 13). Jesus é a verdade (v. 13), é a Palavra de Deus (Jo 1,1-18), pronunciada em caráter definitivo à humanidade. Jesus é a verdade, e é o Espírito Santo que torna vida esta verdade. Disse Jesus: “Ele não falará por si mesmo, mas dirá tudo quanto tiver ouvido e vos anunciará o que há de vir” (v. 13b). O Pai enviou o Filho para a nossa salvação, na força do Espírito Santo. Na ‘Ascensão do Senhor’ contemplávamos que o Filho voltou para o seio do Pai. Pai e Filho enviam o Espírito Santo para que recorde em nós as palavras e a ação de Cristo, para que demos testemunho, que este testemunho produza frutos, e que os frutos permaneçam (cf. Jo 15,16).
13. Jesus Cristo é o Messias, é o Salvador da humanidade. Jesus Cristo é Quem cumpre as promessas feitas ao Povo de Israel (Mt 5,7.20; Lc 24,44ss). Agora, ouvimos Jesus prometer o Espírito Santo. Aquele que cumpre as promessas também faz uma promessa: Jesus promete o Espírito Santo. Há algo aqui importante para a nossa fé. De um lado, a missão de Jesus, a nossa salvação, já está acabada. Jesus, com sua Páscoa – Sua morte e ressurreição – realizou a salvação da humanidade. Assim, Jesus cumpriu as promessas feitas ao Povo de Israel, e proporcionou a salvação a toda a humanidade. A salvação da humanidade foi, assim, realizada por Jesus Cristo. Contudo, a salvação precisa ser proposta, precisa ser acolhida. Por isso, Jesus, Aquele que cumpriu as promessas, promete o Espírito de Deus, o Espírito Santo, para prolongar a Sua obra salvífica. Por isso, Jesus disse que o Espírito recebe o que é d’Ele (16,14-15) para conduzir os discípulos à plenitude da verdade (cf. Jo 14,26). Aqui entendemos, também, como as missões do Filho e do Espírito são mutuamente implicadas e favor da nossa salvação. Sem o Espírito Santo, Jesus Cristo seria um personagem do passado. É o Espírito Santo que nos fez ter fé que Jesus Cristo é o Senhor (2ª. leitura) e, assim, podemos confessar, em cada missa, que “Ele está no meio de nós!”. Por isso, Aquele que cumpre as promessas do Antigo Testamento promete o Espírito Santo. E, tendo retornado ao seio do Pai, Pai e Filho enviam o Espírito Santo, para que a presença de Cristo se dê na vida e na missão dos Seus discípulos, na vida e na missão de Sua Igreja. Na Última Ceia, Jesus prometeu o Espírito Santo, como ouvimos no Evangelho, e o Pentecostes é o cumprimento, para a Igreja possa viver na força e no poder do Espírito Santo. Já não mais no monte Sinai, mas no Monte Sião – Jerusalém – Deus constituiu o Novo Povo, com Maria, com os 12 Apóstolos, o Novo Israel, e com a adesão das nações, então conhecidas. Foi, assim, o “nascimento” da Igreja, do Novo Povo de Deus, do Povo que celebrou com Deus a Nova Aliança, não mais na pedra, mas nos corações, na força do Espírito de Deus.
14. Meus irmãos, com a Solenidade de Pentecostes, concluímos o Tempo Pascal de 2012. Celebramos a vinda do Espírito Santo e a fundação da Igreja, o Novo Povo de Deus, o Povo da Nova Aliança, o Corpo de Cristo. Assim, inseridos no Corpo de Cristo, renovamos o compromisso de amar de promover a vida. Inseridos no Corpo de Cristo, com dons e carismas diferentes, renovamos o compromisso de servir o próximo por amor de Deus. Inseridos no Corpo de Cristo, na força do Seu Espírito, caminhamos para o Pai dos Céus, em Quem somos todos irmãos, na construção do Reino de Deus nesta terra, que terá nos Céus a sua consumação. Inseridos no Corpo de Cristo, seguimos os Seus passos, amando o próximo por amor de Deus. Concluímos o Tempo Pascal manifestando, também, a nossa disposição de corresponder tanto amor que Deus tem por nós! 

V. Louvado seja N. S. Jesus Cristo!