XXIV DOMINGO DO TEMPO COMUM
E vós quem dizeis ser o Filho do Homem?
Marcos no Evangelho de hoje nos mostra o dinamismo de Jesus, bem como dos incansáveis discípulos que sempre o seguiam. Jesus é dinâmico e quer inaugurar o Reino com dinamicidade para que ninguém se afunde na ociosidade.
Mesmo que os que convivessem com ele o considerassem formidável e extraordinário, sempre pairava no ar um pequeno questionamento sobre sua identidade: quem é este homem? As multidões se perguntavam sobre Jesus, pois viam seus feitos... expulsava demônios (Mc 1,27), realizava milagres inexplicáveis, ordenava o mar e grandes ondas o obedeciam (Mc 4, 41)... são fatos já apresentados nos capítulos anteriores de Marcos que vão prenunciando os questionamento de hoje: Quem é este homem?
O que vemos hoje no Evangelho de Marcos é a parte central. Vemos Jesus revelando-se ao responder a dúvida que todos carregavam. O fato se dá em Cesaréia de Filipe onde um dos filhos de Herodes, o Grande, fundou a capital do seu reino. Fica no norte de Israel, onde a maioria era pagã. Talvez foi este o motivo que fez Jesus se dirigir até lá, saindo da Galiléia. Isto revela a abrangência da missão de Jesus: levar o Reino a todos os povos. Como não havia automóveis, nem avião, como nos velhos tempos, entre aldeias se andava a pé, o que dava margem para um bom bate-papo com quem acompanhava no caminho. Jesus aproveita este momento para puxar um questionamento: “Quem dizem os homens que eu sou?” Mas é na segunda pergunta, no rebote que Jesus põe todos no “paredão”: “E vós quem dizeis que eu sou?”
Tanto o povo quanto Herodes possuía vários conceitos e opiniões sobre a identidade de Jesus. Cada um dizia uma coisa: “João que ressuscitou... é Elias... é algum dos profetas. Tudo bem até ali. As opiniões do povo nem tanto interessavam a Jesus. O que ele quis atingir com a segunda pergunta foi arrancar dos discípulos o que eles pensavam dele. Será que os apóstolos estão assimilando a catequese de Jesus? Progrediram mais que o povo? Dias antes os reprendeu afirmando que tinham olhos mas não viam, ouvidos mas não escutavam, estavam com o coração endurecido, ou seja, não poderiam descobrir e assimilar a verdadeira identidade de Jesus. Seguem-no, mas sem saber o caminho. Pareciam homens perdidos no caminho...
Mas a supresa do Evangelho de hoje mostra na figura de Pedro que fala em nome todos: “Tu és o Cristo! És aquele de quem todos os profetas falaram e anunciaram”. Talvez os discípulos ficaram murmurando para descobrir a verdadeira resposta, mas Pedro fala em nome de todos. O que os outros deveriam ter cochichado não se sabe. Mesmo assim, novamente Jesus impõe o silencio para que não divulgassem quem é ele (vv. 27-30).
Apesar de Pedro ter respondido com exatidão, sua ideia – assim como dos demais discípulos - ainda estava presa à antiga mentalidade. Pensava na exaltação de Jesus através de sinais que provocariam a atenção de todos e mostrasse o “poder” do Mestre. Pensavam ainda que seria como um grande líder poderoso que dominasse sobre os reinos do mundo daquela época. Esta confusão mental Jesus percebeu na hora e tentou dar uma nova catequese.
O mesmo ocorre conosco que proclamamos nossa fé com todas as certezas, sem duvidar de nenhum dogma. Se nos perguntarem qual a ideia que temos sobre Deus, termos a resposta que nos foi dada na catequese. E hoje se pensarmos no avanço do Reino de Deus fundamentado nas grandes aglomerações, aplausos e holofotes, estaremos rasgando páginas da catequse que recebemos. Ou seja, assim como os discípulos souberam afirmar quem era Jesus, mas estavam presos em antigos conceitos de poder, estaremos repetindo o mesmo comportamento, porém com um verniz diferente.
Na segunda parte desta perícope, Jesus alerta para o sofrimento que irá passar, que seu destino não tem nada a ver com o poder temporal que traria sucesso, mas sim está relacionado com o fracasso e que ele será derrotado. Isto deixou os discípulos perplexos e parecendo desiludidos com seu Mestre. Afinal abandonaram tudo, família e os barcos para o seguirem. Se questionam... eles não entenderam ainda que Jesus está ensinando a doação total da vida.
Diante desta proposta de Jesus, diferente da lógica humana do poder, Pedro reage em nome de todos os discípulos (vv 32-33). Pedro não está a fim de seguir um caminho que leve ao fracasso e por isso tenta mudar o pensamento de Jesus. E Jesus responde com ira: “Afasta-te de mim, Satanás!” Isto não significa que Jesus está exonerando Pedro do grupo dos discípulos, mas sim, mostrando-lhe que quer tê-lo no Reino como alguém que se libertou da mentalidade do maligno. Por isto são três os requisitos para seguir Jesus: “renega-te a ti mesmo, toma a tua cruz e segue-me!”.
E para nós: quem é Jesus? Acredito que muitos conceitos podem ser formados (diferentes uns dos outros) de cada um que o segue, inclusive você que está refletindo esta mensagem. Porém cuidado: nunca ponha um ponto final no seu pensamento sobre ele, afinal quando dizemos quem é Ele e colocamos um ponto final na frase, nós acabamos com Ele, pois Ele transcende a tudo o que a humanidade pode pensar sobre Ele. Seria engaiolá-lo. Não devemos ser “admiradores”, mas discípulos de Cristo.
Dom Orani João Tempesta, OCis
Arcebispo Metropolitano da Arquidiocese do rio de Janeiro